
Lucas van Hombeeck é poeta e mestrando em Sociologia da cultura, simbolismo e linguagem pelo PPGSA/UFRJ. Membro da Oficina Experimental de Poesia (OEP), publicou em 2017 o Almanaque Rebolado (Azougue/Garupa/Cozinha Experimental). É autor de Nuvens [na seção de congelados] (7letras, megamíni) e Pará ocidental (no prelo), de onde foi tirado o poema abaixo.
* * *
1.1 Conceição
>recife
um telegrama conta
das articulações
justas onde passa
a faca
um pouco cega
estala
as cartilagens ossos ainda
um pouco quentes
do sangue
guardado
para o dia seguinte
das irmãs,
a que não tem
nojo de quebrar
o pescoço da ave
os dedos
machucados pelas bocas
da lâmina
sulca
meia lua
a pele grossa
do pato
repuxando
depenada
a carnadura
coração brechó
descendo a
cidade
pede a deus
imprecação
que a chuva poupe as telhas pobres
e mais nada
refeita das panelas
de alumínio mastigado
assunta o pó
do aparelho
numa travessa
da Gentil
ouvindo os carros
você não tem o
direito de anarquizar com a minha
vida
das irmãs,
a que não foi
ao funeral das
irmãs, a que não
foi
ensaio
silencioso
da ladainha aprendida
no pé do morro
que leva
seu nome enquanto a festa
da virgem
arrebenta
em procissão
II comando aéreo regional
1T Cauby
assiste entediado ao vídeo
do youtube é
Roberto Carlos
nos arcos da lapa
como o cantor
que não lhe dava presentes porque
seu nome não era
Lavínia ou Lísia e por isso
Não chamaria assim tampouco a
cria
descascar os peixes
amassar o alho
receber as piores
notícias
dos mais limpos
lábios
assobiar fumar tabaco
a seu jeito
ensinaria
seu gênio
às cebolas
sono das
crianças que
se esforçam sobem
o balcão tentam
tocar a madalena
enquanto olham
com fascínio
o açúcar
cristal cobrindo
as bordas
do doce
de maracujá
no tabuleiro
Eneida
viveria a sonhar
com coisas
que o mundo não tem;
Olga,
uma canção de Elvis Presley
para flauta
e violão.
Dor de conceição
multiplicada gênese
do desterro
o pato
é um bicho
que migra
por isso a dureza
da carne escura
porcelana dura
sobre o duro da caixa
despegando o esmalte
do aparelho presente
de casamento
essa dureza não é força
rumina
tentando a subida
descendo tentando
ser outra vez
desejando
pelo marido
que fique
um pouco
menos louco
que um soldado
no front
trabalhando
com dureza
os atos administrativos
uma serpente
com a boca cheia
de colgate
e anfetamina
num adesivo
no para-brisa
diz
senta a púa
brasil
enquanto espera
a convocação
do concurso
a data
do bilhete
da Panair